O Banco Central Europeu está avaliando se o euro digital poderia ser lançado em grandes blockchains públicas, como Ethereum ou Solana. De acordo com pessoas familiarizadas com as discussões citadas pelo Financial Times, essa opção está sendo considerada com mais seriedade do que antes e representaria um afastamento notável do plano original de depender exclusivamente de um livro-razão privado com permissão.
A ideia de colocar uma moeda digital soberana em um blockchain aberto sinaliza um potencial ponto de virada para a estratégia de finanças digitais da Europa.
Ao contrário dos sistemas privados, onde apenas partes autorizadas podem acessar e validar dados, blockchains públicas como Ethereum e Solana são abertas a qualquer pessoa. Essa abertura poderia permitir que um euro digital se integrasse mais facilmente à crescente infraestrutura de finanças descentralizadas, ativos tokenizados e aplicativos programáveis já em execução nessas plataformas. Um dos funcionários envolvidos no projeto observou que uma versão privada do euro digital se assemelharia à abordagem adotada pela China com seu yuan digital, enquanto uma versão pública estaria mais próxima do modelo seguido por empresas privadas nos Estados Unidos que emitem stablecoins.

O contexto geopolítico é um fator importante. Os reguladores europeus têm se preocupado cada vez mais com a influência das stablecoins lastreadas em dólar, que compõem quase todo o mercado de stablecoins.
Em abril, Piero Cipollone, membro do conselho do BCE, alertou que a dependência de tais instrumentos poderia minar a autonomia do sistema financeiro europeu, tornando necessário um euro digital como contrapeso. A mudança para considerar Ethereum e Solana pode ser vista como uma resposta direta a esse desafio, especialmente depois que os Estados Unidos avançaram em sua própria estrutura para stablecoins por meio da ‘Lei GENIUS’.
Especialistas argumentam que lançar o euro digital em uma blockchain pública teria vantagens e riscos. O lado positivo é que poderia melhorar a interoperabilidade e promover a inovação, explorando ecossistemas que já hospedam milhares de desenvolvedores e aplicativos. Também poderia incentivar a adoção, visto que muitas carteiras e serviços financeiros já suportam Ethereum e Solana. O lado negativo é que essa abordagem levanta questões sobre privacidade e governança. Uma rede pública registra transações permanentemente, o que poderia entrar em conflito com as leis de privacidade europeias, como o GDPR. Há também preocupações de que o envolvimento do Estado em uma rede pública possa afetar sua neutralidade e descentralização.
Além disso, redes como Ethereum e Solana, apesar de sua maturidade, enfrentaram congestionamentos, interrupções e incidentes de segurança no passado, o que destaca a importância da gestão de riscos caso se trate de uma moeda digital emitida por um banco central.

Por enquanto, o Banco Central Europeu não confirmou se Ethereum ou Solana serão utilizados, e suas declarações oficiais enfatizam que nenhuma decisão final foi tomada em relação à tecnologia. Espera-se que o conselho determine até o final de 2025 se o euro digital prosseguirá para emissão. Até lá, o projeto permanece em fase de concepção e testes, mas a mera consideração de blockchains públicas demonstra que a Europa está disposta a repensar os fundamentos de sua arquitetura financeira para se manter competitiva e proteger sua soberania monetária.